05/02/2010

Simplicidades poéticas

Foto: Suzana Massini

Quantas vezes não nos traduzimos tanto nas poesias ou canções escritas, a ponto de parecer ter sido 'roubados' os nossos pensamentos em quanto dormia?

Por isso costumo amar os versos mais simples, aqueles que possuem a beleza das palavras subjetivas sem parecer apenas um balaio de significados, em que muitas vezes o leitor se sente perdido, sem identificação. Prefiro as tramas que chama o leitor pra compartilhar e por vezes causar distintas impressões pessoais daquilo que é dado, como já disse Lya Luft "Para mim é aquela mesma fala no ouvido do leitor, que tanto me agrada e faço em romances ou poemas - um chamado para que ele venha pensar comigo."
Não desmereço aqui nenhuma forma poética, a arte literária como todas as outras é rica devido a liberdade de criação, mas expresso aqui apenas a estética que mais me cativa, me toca! Veja abaixo alguns exemplos dos meus autores preferidos.


Para não dizer adeus

A certeza vela atrás de um muro
ou dorme num poço
onde nada se escuta ou avista.

Sempre que partes, morro um pouco
por não saber se retornas.
Minhas mãos doem de tanto abrir-se
para que vás tranquilo.
Só assim hás de querer estar comigo:
sem que eu insista.

(Fingir que te deixo livre
é um jeito egoísta
de amar.)
Lya Luft

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"Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais. Não me é necessária, assim como se eu tivesse perdido uma terceira perna que até então me impossibilitava de andar mas que fazia de mim um tripé estável. Essa terceira perna eu perdi. E voltei a ser uma pessoa que nunca fui. Voltei a ter o que nunca tive: apenas as duas pernas. Sei que somente com duas pernas é que posso caminhar. Mas a ausência inútil da terceira me faz falta e me assusta, era ela que fazia de mim uma coisa encontrável por mim mesma, e sem sequer precisar me procurar.
(...)
Sei que precisarei tomar cuidado para não usar superficialmente uma nova terceira perna que em mim renasce fácil como capim, e a essa perna protetora chamar de uma verdade ".
Trecho de "A Paixão segundo G.H" - Clarice Lispector
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"Beijo pouco, falo menos ainda. / Mas invento palavras / Que traduzem a ternura mais funda / E mais cotidiana. / Inventei, por exemplo, o verbo teadorar. / Intransitivo: / Teadoro, Teodora."
Manuel Bandeira
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- Existe uma infinidade de autores com essa sensibilidade em versos simples, outros que também gosto muito em suas crônicas, como o Caio F Abreu, Carpinejar, ou mesmo Vinícios de Moraes, mas deixarei o seu tempo livre para as buscas ou citações nos comentários, daqueles que te tocam!

By Raiana, que se transparece nos versos e sorri entre os subentendidos.

4 comentários:

  1. Adorei!
    Perfeito.
    Nós poetas conseguimos transmitir o que sentimos sem simples versos,o que os tornam tão especiais.
    Adorei as palavras do Manuel Bandeira.
    beijos.

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  2. Também não sou muito chegado a "floreios". Digo, a poesia que dá muitas e muitas e muitas voltas para encerrar um sentimento ou momento que poderia ser melhor transmitido em uns poucos versos ou até mesmo em uma pequena crônica.

    E aí vamos e voltamos: o que se escreve com "o coração" é muitas vezes mais rico do que todas as técnicas e teorias utilizadas em um poema, romance, conto ou crônica - e aí os literatos querem me matar quando digo isso. É que não falo em erudição, falo em sentimento mesmo. Isso costuma ser confundido em muitos casos. Ou, pior, valoriza-se um texto pela posição acadêmica do escritor.

    Entre Zé Sarney escrevendo sobre o Nordeste e o Patativa do Assaré, prefiro o último...rs. É a simplicidade que prevalece e melhor "descreve" o cenário, o momento, o sentimento.

    Talvez seja até por isso que eu goste de uns malucos que escreviam com fúria e sem papas na língua: Bukowski, Fausto Wolff, John Fante, Mark Twain, Fernando Pessoa, Lima Barreto...só gente meio desajustada, né? rs Mas simples e diretos. Mas tô descobrindo gente "nova",(e mais equilibrada rsrs) como o Affonso Romano - manda bem nos poemas e crônicas; Artur Azevedo, Carlos Trigueiro, enfim...é o que me toca também. rs

    Beijo, moça! E boas escolhas, viu? Esse Manuel Bandeira é direto e surpreendente, né?

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  3. Adorei!
    Perfeito.[2]
    Esse verbo teadorar é ótemo!! rs ;)

    Não sei pq lembrei agora de:

    Só me lembra que um dia formoso
    Eu passei... dava o sol tanta luz!
    E os meus olhos, que vagos giravam,
    Em seus olhos ardentes os pus.
    Que fez ela? eu que fiz? - não no sei;
    Mas nessa hora a viver comecei...
    (Trecho de Inferno de Amar - Almeida Garrett)

    Beijo, minha escritora!

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  4. Adorei conhecer esse lindo espaço de poesia!!!

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